Às
vezes tenho vontade de ser louco... Ou de ter sido louco! De ir ou ter ido às
últimas conseqüências. De ter arriscado ou estar arriscando. De sumir durante o
dia, viajar pra longe, voltar à noite. Ou se não der tempo, só no dia seguinte,
dois dias depois, nunca mais... Tanto faz!
Às
vezes dá vontade de ter alguém te esperando quando chegar... Essa vontade, na
verdade, é permanente. Mas como muitas vezes não tem, dá vontade de voltar não.
Às
vezes não dá vontade de acordar. Não para sempre! Só por hoje, ou por dois
dias. Sei lá, para esperar os dias de frio e chuva passarem. Ou passar direto
pela segunda-feira. Ou pra chorar dormindo e acordar quando o lençol estiver
seco, para ter a impressão de não ter chorado.
Às
vezes dá vontade de ter vontades... De olhar para dentro, na alma. De entender
as vozes da alma, os gritos perturbadores que clamam por liberdade.
Às
vezes dá vontade de ser o velho eu. Ou antecipar de uma vez o que deverá ser o
próximo eu. Pensando assim, parece mesmo que eu sempre vou querer mudar. E ter
novas vontades.
Já é
um começo – e tanto - para quem acha que nunca tem vontade de nada. Talvez eu
subestime demais as minhas vontades, a ponto de dizer que não as tenho. Que
louco! Olha, não era eu quem queria ser louco, há algumas linhas acima?
Às
vezes dá vontade de saber nadar. De me igualar aos peixes e ir, lutando contra
predadores, chegar às águas calmas, descansar e talvez tentar voltar... Ou
cansado de lutar, seguir o fluxo do rio, e descobrir, tal qual a vida, onde o
rio vai dar. Espero que os peixes gostem de água salgada.
Às
vezes dá vontade de ter crescido em outro lugar, de ter experimentado outras
aventuras, ter tido outros amigos, e seus tipos também diferentes. Sei lá,
talvez só para testemunhar de dentro o que é ser outra pessoa, com outra
educação, manias e costumes. Ter ido a outras festas, mergulhado em alguns
livros, aprendido em outra cultura, ser portador de outro sotaque.
Muitas
dessas vontades vêm de forma espontânea, mandantes de suas próprias vontades de
vir e ficar. Ou ir embora, só pelo prazer de deixar o ímpeto de experimentar.
Outras vêm depois de uma leitura, ou um filme que deixa mensagens sutis. Às 2
horas da manhã, porque nesse horário não tem mais barulho. Posso ouvi-lo,
vê-lo, senti-lo e perceber seus sinais. E a partir daí, ter tais vontades, que
podem ir embora enquanto durmo, ou se reforçar nos meus sonhos. E ao acordar, agilizá-las,
ou dizer “não... talvez eu queira, mas deixa para lá. Preguiça demais para essa
vontade.”.
Posso
realizar algumas dessas vontades. As que se podem concretizar em tempo
presente. Alias, posso tentar... As que não custam mais que do que há no meu
bolso. Pensando um pouco, percebi que sonhos e vontades cabem no mesmo quarto,
são amigos íntimos. A diferença é que os sonhos devem ser – embora nem sempre sejam
– mais fortes que as vontades, que são volúveis, instáveis. Os sonhos não!
Devem gritar dentro da gente como quem quer existir por desejo próprio, pedindo
ajuda, implorando realização. Os sonhos devem ser felizes ou no mínimo,
combustíveis para a felicidade. Uma espécie de alvo para o dardo, maça para a
flecha, o mar para o rio, e o horizonte para o mar. Deveria ser, aliás, o
horizonte para nós. Distante, porém, desejável.
É
uma pena, ainda assim, nós preferirmos ter vontades ao invés de sonhar!
Leonardo Pierre